Carreira do filósofo Eduardo Lourenço é distinguida

13/01/2021 - 10h31 | Edição 2020

Nascido em São Pedro de Rio Seco, na Beira Interior, em 1923, e falecido a 1 de dezembro de 2020, em Lisboa, o Professor Eduardo Lourenço, filósofo e ensaísta, foi um dos principais filósofos cuja obra contribuiu para a reflexão crítica sobre Portugal e a Europa. Eduardo Lourenço frequentou o Colégio Militar em 1934 e em 1940 ingressou na Universidade de Coimbra, onde se licenciou em Ciências Histórico-Filosóficas. Foi no ambiente académico conimbricense, em 1949, que publicou o seu primeiro livro, intitulado Heterodoxia, do qual faz parte um fragmento da sua tese de licenciatura, O Sentido da Dialéctica no Idealismo Absoluto.

Professor Eduardo Lourenço, vencedor do Prémio Carreira (Foto: Guilherme Fonseca)

No seu percurso profissional e académico, Eduardo Lourenço lecionou em Bordéus, Montpellier, Grenoble, Nice (França), Hamburgo, Heidelberg (Alemanha) e Bahia (Brasil). A divulgação do pensamento lourenceano pelo mundo muito deve ao trabalho de Annie Salamon, sua esposa e tradutora, que traduziu para francês a maioria das suas obras. Foi Conselheiro Cultural (1989-1991) e de Estado (2016-2020). Para além de receber diversos prémios, foi igualmente agraciado com várias condecorações, comendas, homenagens e honras académicas pelo contributo do seu pensamento crítico na cultura portuguesa.

É inegável o vasto contributo científico e intervenção cultural do pensamento do Professor Eduardo Lourenço no âmbito da cultura, cidadania e cooperação europeia e ibérica. Profundamente político, poético, criativo, despretensioso, irreverente e inspirador, o Professor Eduardo Loureço destaca-se pela densidade política e crítica do seu pensamento. À semelhança de Raymond Williams, Richard Hoggart e Edward Palmer Thompson, fundadores dos Estudos Culturais, também Eduardo Lourenço interroga, filosoficamente desalinhado com a ordem, a cultura nas suas mais variadas dimensões.

Tal como preconizado pelos estudiosos dos Estudos Culturais, o pensamento lourenceano, que reflete Portugal, a Europa e as ex-colónias, também parte das margens: quer sobre o que permaneceu na sombra, nos factos esquecidos ou recalcados e, portanto, em situação de permanente oposição ou conflito interno, como a desmemória nacional intencional e seletiva ou o trauma relativamente ao (pós-)colonialismo português, a lusofonia e a contestação transatlântica ao pensamento luso-tropicalista de Gilberto Freyre, quer sobre a esperança da construção de uma Europa Utópica fora de uma conceção ou paradigma cultural eurocêntrico, hegemónico e norte-americano.

O inegável contributo que as reflexões do Professor Eduardo Lourenço trazem, sobretudo quando agregadas ao seu contexto de produção e à visão de conjunto da sua obra, e que fornecem uma fonte científica inesgotável para (re)pensar e refletir profundamente as culturas portuguesa, ibérica e europeia como construções simbólicas, mitológicas, imaginárias, políticas e críticas foi o que motivou a decisão a que chegou o júri do Prémio Internacional em Estudos Culturais – Virgínia Quaresma de atribuir, por unanimidade, o Prémio Carreira ao Professor Eduardo Lourenço, a título póstumo, pelo inestimável contributo científico e cultural da sua obra dentro do campo dos Estudos Culturais.